segunda-feira, 5 de setembro de 2011

De Que Banda é Minha Umbanda?



            Esta é uma reflexão de caráter pessoal, que tem como base conceitos encontrados na literatura umbandista de modo geral. 

 
                A Umbanda é uma religião de cunho espiritualista, que crê na existência dos espíritos e do mundo espiritual, que se manifestam pelos médiuns, ou mediadores. Seus praticantes e entidades espirituais trabalham com manipulações magísticas, com utilização de elementos ou instrumentos místicos.
            Há que se entender antes de qualquer consideração que a Umbanda é composta por elementos Divinos, Doutrinários, Filosóficos, Rituais, Místicos, Divinatórios e Humanos. Agrega elementos de bases africanas, indígenas, orientais e judaico-cristãs. Estes elementos podem ser vistos com mais ou menos intensidade de acordo com a linha doutrinária da casa (linhas doutrinarias ou escolas doutrinarias), o que torna esta uma religião aberta, com inúmeras diferenças de interpretação. Diferenças estas que podem variar regionalmente ou até mesmo de terreiro para terreiro.
            Dentro deste panorama diversificado, sempre cabe a pergunta: de banda é minha umbanda? Popular, tradicional, esotérica, africanista, umbandoblé, de caboclos, de preto-velhos, etc?
            Ao aprofundar meus estudos na esfera Umbandista e espiritualista de modo geral, logo me deparei com estas várias formas de professamento e pratica da Umbanda. Ao primeiro momento me dediquei ao estudo e entendimento dessas “classes” que me foram apresentadas em diversos livros e textos com os quais foi tendo contato, e logo me perguntei: Em qual dessas “realidades” me encaixo como Umbandista? Que tipo de Umbanda é praticado no meu terreiro? Onde estou inserido como médium neste Universo? E as entidades que trabalham comigo de que “linha” elas seriam?... Durante um tempo estas questões ficaram latentes em minha mente.
            Bom, sou Biologo de formação, e durante meu curso entrei em contato com diversas ciências, e dentro de todas elas existem classificações. Na área de biológicas existe uma ciência conhecida como Taxonomia Sistemática, que se dedica a inventariar e descrever a biodiversidade e compreender as relações filogenéticas entre os organismos. Fato é, que muitas das classificações taxonômicas que existiram, por muito tempo, foram as morfológicas. Eram analisados padrões morfológicos entre as espécies e estas agrupadas de acordo com suas diferenças ou semelhanças. Com adventos tecnológicos mais modernos, estes “padrões” mais generalistas foram caindo em desuso, ganhando lugar a classificação e agrupamento, levando em conta características mais intrínsecas, como as de bases genéticas. Depois dos avanços nesta área, surgem quase que diariamente, varias propostas de redefinição de termos biológicos largamente aceitos, como filo, classe, espécie e população. Vários organismos entram e saem de diferentes classes, de acordo com estudos cada vez mais aprimorados que são realizados. Assim sendo, já é amplamente aceito, que qualquer tipo de classificação é um meio do homem entender sistemas, que podem aparentar-se simples, mas que são amplamente complexos em estrutura e funcionalidade.
            Voltando aos questionamentos anteriores, depois de alguns estudos e reflexões, vi nas ditas “Escolas Umbandistas”, nada além do que um sistema de classificação, análogo a Sistematica no ramo das ciências. Não vejo problema algum em classificar, a classificação é necessária para se haver entendimento, questionamento, troca de informações e aprimoramento de conceitos. Porém acho extremamente prejudicial o rotulo, que cai como uma luva e engessa o pensamento. Neste sentido, percebi que questionamentos tais são de veras irrelevantes. Para que se preocupar com as diferentes formas, se na realidade, o que realmente importa é a Genética, o intrínseco, o que está onde os olhos não conseguem enxergar?
            “Não importa o terreiro, o que importa é a Umbanda.” A Umbanda que traz a mensagem de amor, de fraternidade, de caridade e de respeito. Não há porque segregar, devemos unir. A diversidade existe, e esta existe não só quando tratamos de Umbanda ou religião, é algo da natureza, do homem e da divina. Dentro de seus propósitos essa diversidade atinge seu objetivo: disseminar a mensagem da espiritualidade Maior, volver “o espírito para a caridade”.
            Cada um dentro do seu entendimento e da sua prática, devemos nos entender como Umbandistas, seguindo o preconizado em seu terreiro e respeitando o diverso. Acho que buscar o conhecimento é essencial, mas não nos fechemos em nossas ataduras, que nos engessam, nos rotulam e estagnam. Acho que devemos classificar, agrupar, desclassificar, desagrupar, reagrupar, mas dentro da minha humilde percepção, não devemos nos esquecer da essência, da profundidade, afinal somos todos, entidades, médiuns, dirigentes, assistentes, espíritos em constante evolução.

“Quando se vê um preto velho sentado em seu banquinho, pitando seu cachimbo e falando errado, ali vemos a Umbanda,
quando se escuta o som dos ataques, das palmas ou a simplicidade das corimbas ou mantras, ali vemos Umbanda,
quando vemos as imagens no altar ou orixás em nossos corações, ali vemos Umbanda,
quando sentimos o cheiro das ervas e vemos o colorido das flores, ali vemos Umbanda,
onde se vê a Humildade ali vemos Umbanda,
onde vemos amor, ali vemos Umbanda.
Vemos Umbanda de forma esotérica, africanista, tradicional, enfim de várias formas, mas será que realmente estamos prontos para “ver” UMbanda?”

“Deve-se respeitar as várias formas de expressão da Umbanda. O mais certo é aquele onde a humildade é a guia infalível para os filhos não caírem na presunção, vaidade e prepotência.” (Pai Firmino do Congo – 07/06/07)

Algumas das muitas refêrencias para o assunto:
“união e respeito a diversidade”. Paulo C.L. Vicente. http://www.ftu.org.br/
“Umbanda e Universalismo”. Lista da Choupana Caboclo Pery – Porto Alegre
“Umbanda – Mitos e Realidade” – Yassan Ayporê Pery
“Umbanda Pé no chão” – Ramatís
“Umbanda sem medo” – Claudio Zeus

sábado, 3 de setembro de 2011

Um Pouco Sobre a Origem da Umbanda

O texto a seguir foi transcrito do livro "Umbanda para os médiuns", obra mediúnica ditada pelo espírito Caboclo Paraguaçu, através da médium Florisbela Maria de Souza, no ano de 1958. Nesta época pouco se estudava ou publicava sobre Umbanda, na verdade, os umbandistas mal falavam sobre ela fora dos terreiros. Muito se discutia: qual seria sua origem? Seria uma religião genuinamente brasileira? Ou uma mistura de ritos de afro descendentes com a cultura branca ocidental? Neste texto, podemos perceber que com extrema simplicidade o Caboclo Paraguaçu, desenrola a história da Umbanda, através da historia dos povos antigos, deixando claro seu  caráter universalista e agregador. Utilizando-se de uma linguagem sem rebuscamentos e popular, descreve as principais matrizes formadoras deste movimento de Luz, primando pela humildade e o fim de certos preconceitos da época. Muito do conteúdo deste texto é encontrado em outros da época e confirmado na literaturas e estudos contemporâneos a cerca da origem do movimento Umbandista no astral e na Terra. (Thiago Silva)



" Origem da Umbanda
             Está escrito nos livros antigos, que a milênios decorridos já se praticavam o Espiritismo, as ciências ocultas, magias, feitiçaria, etc., sendo seus praticantes homens de uma certa cultura que dominavam os leigos. Esses homens eram denominados Magos e Sacerdotes, eram respeitados mas se prevaleciam da ignorância dos povos primitivos para auferir suas vantagens, vindo portanto de longe o comércio religioso.
O que não acontece hoje é a imposição da crença religiosa, porque com suas sucessivas reencarnações o espírito foi se aperfeiçoando, adquirindo cada um o seu livre arbítrio para aceitar essa ou aquela religião, de acordo com seu estado evolutivo.
            O que existe ainda hoje, e vem da origem dos povos, é a luta em torno das religiões, cada qual pretendendo ter a primazia, e por isso umas atacam as outras esquecendo os mandamentos de Cristo: “ Amai-vos uns aos outros!”
            Em eras milenárias, precisamente no Egito, na Índia, China e mesmo em Jerusalém existia os maiores feiticeiros, magos e bruxos. Daí afirmo que os povos da antiguidade também acreditavam piamente, segundo suas crenças, no domínio dos espíritos, e temiam o feitiço, tendo chegado mesmo a queimar os feitiços. Competia aos Magos desmanchar o feitiço, e para isso eles usavam o fogo como um dos elementos destruidores do malefício, e também defumadores e banhos de ervas. Os magos adoravam o Sol, a Lua, a mata, a pedra e as águas.
            Os hindus rendiam homenagem ao Deus Allah, queimando os cadáveres para que os espíritos se elevassem rapidamente, de acordo com os ensinamentos dos Vedas. Os budistas, a filosofia de Confúcio, as práticas religiosas de antanho, traduzem bem que já se praticava o espiritismo, e que já existia algo do ritual da Lei da Umbanda. Quem dentre os encarnados, por mais sábio que seja, pode afirmar qual religião que existia no continente negro, antes do mesmo ser invadido pelos povos de raça branca, que ali implantaram a escravidão?
            Há sem dúvida muita coisa errada na História dos povos e sua origem, porque muitos manuscritos não foram bem interpretados e outros foram queimados, principalmente com respeito à crença primitiva.
            Os negros africanos eram seres humanos, portanto com raciocínio para terem também sua crença, visto como também reencarnaram com o fim de passarem por aquela provação dolorosa, de serem caçados como se fossem feras no deserto, algemados e conduzidos nos porões dos navios, amontoados uns sobre os outros, vendidos a países que se diziam civilizados e professavam uma religião! Escravos! Dura lei de expiação! Resgataram suas dívidas com lágrimas, humilhação e dor!
            O negro velho da Umbanda é o símbolo de uma raça martirizada e não bárbara, como muitos dizem, afirmando que a magia negra é de origem africana, quando ela existiu e existe em toda parte.
            O culto umbandista, professado antigamente no Brasil, começou com a escravidão da raça negra, doa a quem doer esta afirmativa, mas é uma verdade, razão pela qual a maioria dos estudiosos do assunto afirma ser uma seita religiosa     de origem africana. A palavra Umbanda é de origem hindu; portanto, esta afirmativa, mesmo feita pelos espíritos de alguma luz, não se refere a palavra, mas sim ao culto, que é semelhante ao dos antigos escravos, cuja vida de martírio foi tão grande que nem direito de orar tiveram. Eles fugiam para as matas e lá então faziam suas orações, suas súplicas a seus deuses, implorando coragem e resignação para seus sofrimentos. Havia negros de índole boa, tementes a Deus, que sofriam com resignação e não procuravam vingar-se de seus algozes, que eram senhores brancos. Naturalmente seus espíritos estavam preparados para dura prova. Sempre havia um que se destacava do grupo, fazendo a oração, enquanto os outros acompanhavam. Entre eles, Benedito, João, Mateus, Tomé, Joaquim e muitos outros que foram corajosos e resignados, e acalmavam os companheiros quando estes queriam revoltar-se.
            Muitos espíritos, hoje iluminados, usam estes nomes como pseudônimos, para cumprirem sua missão nos terreiros de Umbanda, na humildade de um corpo fluídico de preto-velho. Nós, os desencarnados, não sentimos nenhuma humilhação por alguém dizer que a nossa legião espiritual denominada umbanda é de origem africana. Para isso existe no ritual de umbanda um grande número de expressões originárias daquele continente. Umbanda é de origem divina, é uma legião de espíritos procedentes de varias raças terrenas; daí a razão porque adotamos este nome: UM, representa deus Único, Onipotente, Misericordioso; BANDA, uma falange, uma legião.
            Uma coisa posso afirmar: as maiores entidades espirituais desta seita religiosa foram os negros escravos nesta abençoada Terra de Santa Cruz que teve, uma só mancha negra no puríssimo azul do seu céu e no verde de suas matas, que foi a escravidão!
            Nas polêmicas travadas na Terra pelos adeptos do Espiritismo, uns para combater a Umbanda como sendo o culto dos atrasados, outros procurando defendê-la, pensam eles provar sua origem, e mesmo negar que entre seus trabalhadores desencarnados haja negro africanos, que nada mais seriam que espíritos iluminados tomando esta forma para cumprirem sua missão. Agora eu pergunto: Este espírito iluminado não poderia ter sido um corpo negro, e ter sido escravo, vindo portanto do solo agreste da África?
            Como ainda estão cheios de vaidade certos umbandistas da Terra, e quão distantes se encontram dos ensinamentos do Mestre, mesmo crentes que são, na certeza das reencarnações sucessivas, ainda sentem uma ponta de orgulho, que os impede de se curvarem diante da alma do negro escravizado!
            No entanto, as falanges mais poderosas que praticam a verdadeira caridade são as de terreiro, cujos Guias na maior parte, volto a repetir, foram negros escravizados. Que mais dura prova poderia ter passado um espírito no mundo, para que sua alma fosse lapidada do que os rigores do cativeiro? E os índios, que são os primitivos habitantes do nosso país, também foram sacrificados nos seus costumes e na sua liberdade. Embora alguns Guias caboclos tenham passado por várias encarnações como civilizados, neste país ou em outro qualquer, não deixam de ter tido pelo menos uma encarnação como índio selvagem.
            Existem naturalmente como trabalhadores desta seara bendita, muitos espíritos provenientes do antigo Oriente, do Egito, da Índia, como de outras partes do mundo, entre eles uma quantidade regular de indianos, astecas, etc. São espíritos milenários que não tiveram oportunidade de progredir, e ingressaram nesta Legião para conseguirem a sua reabilitação, o que quer dizer que a nossa origem como espíritos se perde na noite dos tempos.
            É preciso que fique bem claro também, que se houve escravos humildes e resignados, isto foi em número bem menor do que daqueles que se revoltavam contra os senhores e fugiam para as matas, cheios de ódio e desejos de vingança, sendo nisto tentados pelos espíritos maus, porque o Bem e o Mau vem do princípio do mundo. Assim começou o ritual da Quimbanda neste país, porque no continente africano já existiam como existem até hoje e em toda parte, espíritos bons e maus, tanto encarnados como desencarnados.
            Podem se reunir todos os escritores da Terra e procurarem nos livros das religiões primitivas a origem da Umbanda, que não conseguirão compreendê-la. Ela tem mistério impenetrável aos olhos mundanos. Mas provado está perante todos aqueles que forem dotados de inteligência, que tanto Umbanda como Quimbanda, foram praticados no Brasil, primeiro pelos escravos, depois por médiuns, de pouca cultura e maus princípios, que misturaram, como até hoje muitos fazem, os dois rituais, praticando o bem para os amigos e o mal para os inimigos.
            Os Guias umbandistas, então, abandonaram estes médiuns, como nós o fazemos até hoje com os que procuram afastar-se da nossa orientação, que é fazer exclusivamente o bem. Podemos aceitar o 'quimbandeiro' no nosso meio com o único propósito de arrependimento, para que ele seja auxiliado por nós a sair das trevas para o caminho da luz.
            Que os irmãos da Terra sigam a orientação dos verdadeiros Guias de Umbanda, obedecendo fielmente seus rituais, para que se acabe esta confusão que não traz nenhum benefício para os espíritos que estão sofrendo, sejam eles encarnados ou desencarnados. Vamos trabalhar nos terreiros, meus irmãos misturados com os negro-velhos nos seus tocos pitando seus cachimbos, mas fazendo tanta caridade, e deixemos de parte a origem da umbanda!”

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

História da Umbanda

Torna-se imperioso, antes de ocuparmo-nos da Anunciação da Umbanda no plano físico sob a forma de religião, expor sinteticamente um histórico sobre os precedentes religiosos e culturais que precipitaram o surgimento, na 1ª década do século XX, da única e genuína Religião Brasileira.

Em 1500, quando os portugueses avistaram o que para eles eram as Índias, em realidade Brasil, ao desembarcarem depararam-se com uma terra de belezas deslumbrantes, e já habitada por nativos. A estes aborígenes os lusitanos, por imaginarem estar nas Índias, denominaram de índios.
Os primeiros contatos entre os dois povos foram, na sua maioria, amistosos, pois os nativos identificaram-se com alguns símbolos que os estrangeiros apresentavam. Porém, o tempo e a convivência se encarregaram em mostrar aos habitantes de Pindorama (nome indígena do Brasil) que os homens brancos estavam alí por motivos pouco nobres. O relacionamento, até então pacífico, começa a se desmoronar como um castelo de areia.
São inescrupulosamente escravizados e forçados a trabalhar na nóvel lavoura. Reagem, resistem, e muitos são ceifados de suas vidas em nome da liberdade. Mais tarde, o escravizador faz desembarcar na Bahia os primeiros negros escravos que, sob a égide do chicote, são despejados também na lavoura. Como os índios, sofreram toda espécie de castigos físicos e morais, e até a subtração da própria vida.
Desta forma, índios e negros, unidos pela dor, pelo sofrimento e pela ânsia de liberdade, desencarnavam e encarnavam nas Terras de Santa Cruz.

Ora laborando no plano astral, ora como encarnados, estes espíritos lutavam incessantemente para humanizar o coração do homem branco, e fazer com que seus irmãos de raça se livrassem do rancor, do ódio, e do sofrimento que lhes eram infligidos.
De outra parte, a igreja católica, preocupada com a expansão de seu domínio religioso, investe covardemente para eliminar as religiosidades negra e índia. Muitas comitivas sacerdotais são enviadas, com o intuito "nobre" de "salvar"a alma dos nativos e dos africanos.

Os anos sucedem-se. Em 1889 é assinada a "lei áurea". O quadro social dos ex-escravos é de total miséria. São abandonados à própria sorte, sem um programa governamental de inserção social. Na parte religiosa seus cultos são quase que direcionados ao mal, a vingança e a desgraça do homem branco, reflexo do período escravocrata.
No campo astral, os espíritos que tinham tido encarnação como índios, caboclos (mamelucos), cafuzos e negros, não tinham campo de atuação nos agrupamentos religiosos existentes.
O catolicismo, religião de predominância, repudiava a comunicação com os mortos, e o espiritismo (kardecismo) estava preocupado apenas em reverenciar e aceitar como nobres as comunicações de espíritos com o rótulo de "doutores".

Os Senhores da Luz (Araxás, Orixás), atentos ao cenário existente, por ordens diretas do Cristo Planetário (Jesus) estruturaram aquela que seria uma Corrente Astral aberta a todos os espíritos de boa vontade, que quizessem praticar a caridade, independentemente das origens terrenas de suas encarnações, e que pudessem dar um freio ao radicalismo religioso existente no Brasil.

Começa a se plasmar, sob a forma de religião, a Corrente Astral de Umbanda, com sua hierarquia, bases, funções, atributos e finalidades.
Enquanto isto, no plano terreno surge, no ano de 1904, o livro Religiões do Rio, elaborado por "João do Rio", pseudônimo de Paulo Barreto, membro emérito da Academia Brasileira de Letras.
No livro, o autor faz um estudo sério e inequívoco das religiões e seitas existentes no Rio de Janeiro, àquela época, capital federal e centro socio-político-cultural do Brasil. O escritor, no intuito de levar ao conhecimento da sociedade os vários segmentos de religiosidade que se desenvolviam no então Distrito Federal, percorreu igrejas, templos, terreiros de bruxaria, macumbas cariocas, sinagogas, entrevistando pessoas e testemunhando fatos.
Não obstante tal obra ter sido pautada em profunda pesquisa, em nenhuma página desta respeitosa edição cita-se o vocábulo Umbanda, pois tal terminologia era desconhecida.
Foi então que em fins de 1908, uma família tradicional de Neves, Niterói –RJ, foi surpreendida por uma ocorrência que tomou aspectos sobrenaturais: o jovem Zélio Fernandino de Moraes, que fora acometido de estranha paralisia, que os médicos não conseguiam debelar, certo dia ergueu-se do leito e declarou: "amanhã estarei curado".
No dia seguinte, levantou-se normalmente e começou a andar, como se nada lhe houvesse tolhido os movimentos. Contava 17 anos de idade e preparava-se para ingressar na carreira militar na Marinha.


Zélio Fernandino de Morais

A medicina não soube explicar o que acontecera.

Os tios, sacerdotes católicos, colhidos de surpresa, nada esclareceram. Um amigo da família sugeriu então uma visita à Federação Espírita de Niterói, presidida na época por José de Souza. No dia 15 de novembro, o jovem Zélio foi convidado a participar da sessão, tomando um lugar à mesa. Tomado por uma força estranha e superior a sua vontade, e contrariando as normas que impediam o afastamento de qualquer dos componentes da mesa, o jovem levantou-se, dizendo:
- "aqui está faltando um flor", e saiu da sala indo ao jardim, voltando logo após com uma flor, que depositou no centro da mesa.
Esta atitude insólita causou quase que um tumulto. Restabelecidos os trabalhos, manifestaram-se nos médiuns kardecistas espíritos que se diziam pretos escravos e índios. Foram convidados a se retirarem, advertidos de seu estado de atraso espiritual.
Novamente uma força estranha dominou o jovem Zélio e ele falou, sem saber o que dizia. Ouvia apenas a sua própria voz perguntar o motivo que levava os dirigentes dos trabalhos a não aceitarem a comunicação daqueles espíritos e do porquê em serem considerados atrasados apenas por encarnações passadas que revelavam. Seguiu-se um diálogo acalorado, e os responsáveis pela sessão procuravam doutrinar e afastar o espírito desconhecido, que desenvolvia uma argumentação segura. Um médium vidente perguntou:


- "Por quê o irmão fala nestes termos, pretendendo que a direção aceite a manifestação de espíritos que, pelo grau de cultura que tiveram, quando encarnados, são claramente atrasados ? Por quê fala deste modo, se estou vendo que me dirijo neste momento a um jesuíta e a sua veste branca reflete uma aura de luz ? E qual o seu nome irmão ?”


E o espírito desconhecido falou: 


- "Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã (16 de novembro) estarei na casa de meu aparelho, para dar início a um culto em que estes irmãos poderão dar suas mensagens e, assim, cumprir missão que o Plano Espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome, que seja este: Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados."
 

O vidente retrucou: 


- "Julga o irmão que alguém irá assistir a seu culto" ? perguntou com ironia.
E o espírito já identificado disse: 


- "Cada colina de niterói atuará como porta-voz, anunciando o culto que amanhã iniciarei".

 Casa de Zélio - 1908


No dia seguinte, na casa da família Moraes, na rua Floriano Peixoto, número 30, ao se aproximar a hora marcada, 20:00 h, lá já estavam reunidos os membros da Federação Espírita para comprovarem a veracidade do que fora declarado na véspera; estavam os parentes mais próximos, amigos, vizinhos e, do lado de fora, uma multidão de desconhecidos.
Às 20:00 h, manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Declarou que naquele momento se iniciava um novo culto, em que os espíritos de velhos africanos que haviam servido como escravos e que, desencarnados, não encontravam campo de atuação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas em sua totalidade para os trabalhos de feitiçaria; e os índios nativos de nossa terra, poderiam trabalhar em benefício de seus irmãos encarnados, qualquer que fosse a cor, a raça, o credo e a condição social. A prática da caridade, no sentido do amor fraterno, seria a característica principal deste culto, que teria por base o Evangelho de Jesus.


O Caboclo estabeleceu as normas em que se processaria o culto. Sessões, assim seriam chamados os períodos de trabalho espiritual, diárias, das 20:00 às 22:00 h; os participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito. Deu, também, o nome do Movimento Religioso que se iniciava: UMBANDA – Manifestação do Espírito para a Caridade.

A Casa de trabalhos espirituais que ora se fundava, recebeu o nome de Nossa Senhora da Piedade, porque assim como Maria acolheu o filho nos braços, também seriam acolhidos como filhos todos os que necessitassem de ajuda ou de conforto. Ditadas as bases do culto, após responder em latim e alemão às perguntas dos sacerdotes ali presentes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas passou a parte prática dos trabalhos, curando enfermos, fazendo andar paralíticos. Antes do término da sessão, manifestou-se um preto-velho, Pai Antônio, que vinha completar as curas. No dia seguinte, verdadeira romaria formou-se na Rua Floriano Peixoto. Enfermos, cegos etc. vinham em busca de cura e ali a encontravam, em nome de Jesus. Médiuns, cuja manifestação mediúnica fora considerada loucura, deixaram os sanatórios e deram provas de suas qualidades excepcionais.
A partir daí, o Caboclo das Sete Encruzilhadas começou a trabalhar incessantemente para o esclarecimento, difusão e sedimentação da religião de Umbanda. Além de Pai Antônio, tinha como auxiliar o Caboclo orixá Malé, entidade com grande experiência no desmanche de trabalhos de baixa magia.
Em 1918, o Caboclo das Sete Encruzilhadas recebeu ordens do Astral Superior para fundar sete tendas para a propagação da Umbanda. As agremiações ganharam os seguintes nomes: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia; Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição; Tenda Espírita Santa Bárbara; Tenda Espírita São Pedro; Tenda Espírita Oxalá, Tenda Espírita São Jorge; e Tenda Espírita São Gerônimo.
Embora não seguindo a carreira militar para a qual se preparava, pois sua missão mediúnica não o permitiu, Zélio Fernandino de Moraes nunca fez da religião sua profissão.Trabalhava para o sustento de sua família e diversas vezes contribuiu financeiramente para manter os templos que o Caboclo das Sete Encruzilhadas fundou.
Ministros, industriais, e militares que recorriam ao poder mediúnico de Zélio para a cura de parentes enfermos e os vendo recuperados, procuravam retribuir o benefício através de presentes, ou preenchendo cheques vultosos. - "Não os aceite. Devolva-os", ordenava sempre o Caboclo.
A respeito do uso do termo espírita e de nomes de santos católicos nas tendas fundadas, o mesmo teve como causa o fato de naquela época não se poder registrar o nome Umbanda, e quanto aos nomes de santos, era uma maneira de estabelecer um ponto de referência para fiéis da religião católica que procuravam os préstimos da Umbanda.
Zélio Fernandino de Moraes dedicou 66 anos de sua vida à Umbanda, tendo retornado ao plano espiritual em 03 de outubro de 1975, com a certeza de missão cumprida. Seu trabalho e as diretrizes traçadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas continuam em ação através de suas filhas Zélia e Zilméa de Moraes, que têm em seus corações um grande amor pela Umbanda, árvore frondosa que está sempre a dar frutos a quem souber e merecer colhê-los.

Texto retirado do Correio de Umbanda 1ªed. 2006.

HINO DA UMBANDA

De musicalidade e inspiração belíssima, é um dos maiores pontos agregadores da Umbanda. Na letra podemos perceber a importância da grande mensagem que a Umbanda vem nos trazer. O amor, esquecido por muitos, e exaltado pela espiritualidade maior como único meio de aprendizado e elevação. Sua composição reflete o momento em que a Umbanda foi criada, e do alto, de Aruanda, veio a nós iluminando-nos com sua grandeza e simplicidade, atingindo a todos, do rico ao pobre, do negro ao branco, sem preconceitos e barreiras. Podemos perceber como a Umbanda nos impulsiona pela mensagem de amor e caridade, personificada na bandeira de Oxalá, a tanto nos ensinada pelos ensinamentos do cristo: "amai a deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo".




HINO DA UMBANDA

Refletiu a luz divina
com todo seu esplendor
é do reino de Oxalá
Onde há paz e amor
Luz que refletiu na terra
Luz que refletiu no mar
Luz que veio, de Aruanda
Para todos iluminar
A Umbanda é paz e amor
É um mundo cheio de luz
É a força que nos dá vida
e a grandeza nos conduz.
Avante filhos de fé,
Como a nossa lei não há,
Levando ao mundo inteiro
A Bandeira de Oxalá !
Levando ao mundo inteiro
A Bandeira de Oxalá !