O texto a seguir foi transcrito do livro "Umbanda para os médiuns", obra mediúnica ditada pelo espírito Caboclo Paraguaçu, através da médium Florisbela Maria de Souza, no ano de 1958. Nesta época pouco se estudava ou publicava sobre Umbanda, na verdade, os umbandistas mal falavam sobre ela fora dos terreiros. Muito se discutia: qual seria sua origem? Seria uma religião genuinamente brasileira? Ou uma mistura de ritos de afro descendentes com a cultura branca ocidental? Neste texto, podemos perceber que com extrema simplicidade o Caboclo Paraguaçu, desenrola a história da Umbanda, através da historia dos povos antigos, deixando claro seu caráter universalista e agregador. Utilizando-se de uma linguagem sem rebuscamentos e popular, descreve as principais matrizes formadoras deste movimento de Luz, primando pela humildade e o fim de certos preconceitos da época. Muito do conteúdo deste texto é encontrado em outros da época e confirmado na literaturas e estudos contemporâneos a cerca da origem do movimento Umbandista no astral e na Terra. (Thiago Silva)
" Origem da Umbanda
Está escrito nos livros antigos, que a milênios decorridos já se praticavam o Espiritismo, as ciências ocultas, magias, feitiçaria, etc., sendo seus praticantes homens de uma certa cultura que dominavam os leigos. Esses homens eram denominados Magos e Sacerdotes, eram respeitados mas se prevaleciam da ignorância dos povos primitivos para auferir suas vantagens, vindo portanto de longe o comércio religioso.
O que não acontece hoje é a imposição da crença religiosa, porque com suas sucessivas reencarnações o espírito foi se aperfeiçoando, adquirindo cada um o seu livre arbítrio para aceitar essa ou aquela religião, de acordo com seu estado evolutivo.
O que existe ainda hoje, e vem da origem dos povos, é a luta em torno das religiões, cada qual pretendendo ter a primazia, e por isso umas atacam as outras esquecendo os mandamentos de Cristo: “ Amai-vos uns aos outros!”
Em eras milenárias, precisamente no Egito, na Índia, China e mesmo em Jerusalém existia os maiores feiticeiros, magos e bruxos. Daí afirmo que os povos da antiguidade também acreditavam piamente, segundo suas crenças, no domínio dos espíritos, e temiam o feitiço, tendo chegado mesmo a queimar os feitiços. Competia aos Magos desmanchar o feitiço, e para isso eles usavam o fogo como um dos elementos destruidores do malefício, e também defumadores e banhos de ervas. Os magos adoravam o Sol, a Lua, a mata, a pedra e as águas.
Os hindus rendiam homenagem ao Deus Allah, queimando os cadáveres para que os espíritos se elevassem rapidamente, de acordo com os ensinamentos dos Vedas. Os budistas, a filosofia de Confúcio, as práticas religiosas de antanho, traduzem bem que já se praticava o espiritismo, e que já existia algo do ritual da Lei da Umbanda. Quem dentre os encarnados, por mais sábio que seja, pode afirmar qual religião que existia no continente negro, antes do mesmo ser invadido pelos povos de raça branca, que ali implantaram a escravidão?
Há sem dúvida muita coisa errada na História dos povos e sua origem, porque muitos manuscritos não foram bem interpretados e outros foram queimados, principalmente com respeito à crença primitiva.
Os negros africanos eram seres humanos, portanto com raciocínio para terem também sua crença, visto como também reencarnaram com o fim de passarem por aquela provação dolorosa, de serem caçados como se fossem feras no deserto, algemados e conduzidos nos porões dos navios, amontoados uns sobre os outros, vendidos a países que se diziam civilizados e professavam uma religião! Escravos! Dura lei de expiação! Resgataram suas dívidas com lágrimas, humilhação e dor!
O negro velho da Umbanda é o símbolo de uma raça martirizada e não bárbara, como muitos dizem, afirmando que a magia negra é de origem africana, quando ela existiu e existe em toda parte.
O culto umbandista, professado antigamente no Brasil, começou com a escravidão da raça negra, doa a quem doer esta afirmativa, mas é uma verdade, razão pela qual a maioria dos estudiosos do assunto afirma ser uma seita religiosa de origem africana. A palavra Umbanda é de origem hindu; portanto, esta afirmativa, mesmo feita pelos espíritos de alguma luz, não se refere a palavra, mas sim ao culto, que é semelhante ao dos antigos escravos, cuja vida de martírio foi tão grande que nem direito de orar tiveram. Eles fugiam para as matas e lá então faziam suas orações, suas súplicas a seus deuses, implorando coragem e resignação para seus sofrimentos. Havia negros de índole boa, tementes a Deus, que sofriam com resignação e não procuravam vingar-se de seus algozes, que eram senhores brancos. Naturalmente seus espíritos estavam preparados para dura prova. Sempre havia um que se destacava do grupo, fazendo a oração, enquanto os outros acompanhavam. Entre eles, Benedito, João, Mateus, Tomé, Joaquim e muitos outros que foram corajosos e resignados, e acalmavam os companheiros quando estes queriam revoltar-se.
Muitos espíritos, hoje iluminados, usam estes nomes como pseudônimos, para cumprirem sua missão nos terreiros de Umbanda, na humildade de um corpo fluídico de preto-velho. Nós, os desencarnados, não sentimos nenhuma humilhação por alguém dizer que a nossa legião espiritual denominada umbanda é de origem africana. Para isso existe no ritual de umbanda um grande número de expressões originárias daquele continente. Umbanda é de origem divina, é uma legião de espíritos procedentes de varias raças terrenas; daí a razão porque adotamos este nome: UM, representa deus Único, Onipotente, Misericordioso; BANDA, uma falange, uma legião.
Uma coisa posso afirmar: as maiores entidades espirituais desta seita religiosa foram os negros escravos nesta abençoada Terra de Santa Cruz que teve, uma só mancha negra no puríssimo azul do seu céu e no verde de suas matas, que foi a escravidão!
Nas polêmicas travadas na Terra pelos adeptos do Espiritismo, uns para combater a Umbanda como sendo o culto dos atrasados, outros procurando defendê-la, pensam eles provar sua origem, e mesmo negar que entre seus trabalhadores desencarnados haja negro africanos, que nada mais seriam que espíritos iluminados tomando esta forma para cumprirem sua missão. Agora eu pergunto: – Este espírito iluminado não poderia ter sido um corpo negro, e ter sido escravo, vindo portanto do solo agreste da África?
Como ainda estão cheios de vaidade certos umbandistas da Terra, e quão distantes se encontram dos ensinamentos do Mestre, mesmo crentes que são, na certeza das reencarnações sucessivas, ainda sentem uma ponta de orgulho, que os impede de se curvarem diante da alma do negro escravizado!
No entanto, as falanges mais poderosas que praticam a verdadeira caridade são as de terreiro, cujos Guias na maior parte, volto a repetir, foram negros escravizados. Que mais dura prova poderia ter passado um espírito no mundo, para que sua alma fosse lapidada do que os rigores do cativeiro? E os índios, que são os primitivos habitantes do nosso país, também foram sacrificados nos seus costumes e na sua liberdade. Embora alguns Guias caboclos tenham passado por várias encarnações como civilizados, neste país ou em outro qualquer, não deixam de ter tido pelo menos uma encarnação como índio selvagem.
Existem naturalmente como trabalhadores desta seara bendita, muitos espíritos provenientes do antigo Oriente, do Egito, da Índia, como de outras partes do mundo, entre eles uma quantidade regular de indianos, astecas, etc. São espíritos milenários que não tiveram oportunidade de progredir, e ingressaram nesta Legião para conseguirem a sua reabilitação, o que quer dizer que a nossa origem como espíritos se perde na noite dos tempos.
É preciso que fique bem claro também, que se houve escravos humildes e resignados, isto foi em número bem menor do que daqueles que se revoltavam contra os senhores e fugiam para as matas, cheios de ódio e desejos de vingança, sendo nisto tentados pelos espíritos maus, porque o Bem e o Mau vem do princípio do mundo. Assim começou o ritual da Quimbanda neste país, porque no continente africano já existiam como existem até hoje e em toda parte, espíritos bons e maus, tanto encarnados como desencarnados.
Podem se reunir todos os escritores da Terra e procurarem nos livros das religiões primitivas a origem da Umbanda, que não conseguirão compreendê-la. Ela tem mistério impenetrável aos olhos mundanos. Mas provado está perante todos aqueles que forem dotados de inteligência, que tanto Umbanda como Quimbanda, foram praticados no Brasil, primeiro pelos escravos, depois por médiuns, de pouca cultura e maus princípios, que misturaram, como até hoje muitos fazem, os dois rituais, praticando o bem para os amigos e o mal para os inimigos.
Os Guias umbandistas, então, abandonaram estes médiuns, como nós o fazemos até hoje com os que procuram afastar-se da nossa orientação, que é fazer exclusivamente o bem. Podemos aceitar o 'quimbandeiro' no nosso meio com o único propósito de arrependimento, para que ele seja auxiliado por nós a sair das trevas para o caminho da luz.
Que os irmãos da Terra sigam a orientação dos verdadeiros Guias de Umbanda, obedecendo fielmente seus rituais, para que se acabe esta confusão que não traz nenhum benefício para os espíritos que estão sofrendo, sejam eles encarnados ou desencarnados. Vamos trabalhar nos terreiros, meus irmãos misturados com os negro-velhos nos seus tocos pitando seus cachimbos, mas fazendo tanta caridade, e deixemos de parte a origem da umbanda!”
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